sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

veja

vasculhando minhas lembranças
e outras projeções de como devo ser
tentei me refazer
mas não pude ser mais que eu mesmo

queria lhe conquistar
me fazer alguém
aquele alguém que descobri
aquele que lhe encantaria

mas não posso ser outro
a não ser eu

minha barba ainda está por fazer
meus cabelos bagunçados
meus tênis furados
e minha camisa amarrotada

só consigo ser eu mesmo
mesmo sem autenticidade
ainda escrevo versos sem sentido
ainda espero que você os leia

ainda não consigo discriminar...
quando seguir
quando parar...

seus olhos ainda estão presentes
busco seu franzir de testa 
seu olhar ainda indeciso
sua mordida no lábio inferior

tentei ser outro
tentei pensar em outra forma de ser
mas não conseguiria...

por mais que você tente...
sei que ainda espera de mim
aquilo que sempre faço

nossos risos
nosso descompromisso
nossa conversa...

não posso ser aquele cara
aquele de seu ideário
no máximo...
posso ser eu mesmo

talvez não seja tão ruim assim...
talvez você não saiba...
a falta que eu faço
a falta que você me faz

sou ainda um tolo
que tece associações insanas
que pensa em coisas sem nexo
que gosta do seu jeito delicado

fico indeciso se o que vejo
se o que entendo
realmente existe

você ainda é um poço de mistérios
e eu não sou quem você pensa
ainda persigo o incerto

só posso ser eu
nem sou tão ruim assim
você sabe
você sente

sou eu
e ainda vou buscá-la outra vez
vou tentá-la
e no nosso encontro
nosso louco encontro
quem sabe
você se veja
você me veja...

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

tristeza

coloquei meus sapatos
vesti a capa de chuva
mas não fui a lugar algum
continuei aqui
chorando minhas angústias

olhando pela janela vi o céu azul
as nuvens brancas
e ao fechar os olhos...
ainda estava escuro

procurando respostas 
para as perguntas que não tinha
confuso
continuei trancado
trancado em mim

todos os pássaros lá fora
todas as borboletas
não sabem dos meus temores
ao menos a gata
a gata ainda sente meus revezes

pensei em gritar ao mundo minha indecisão
minha falta de coragem
mas percebi que não havia nada
nenhuma palavra a ser dita

quero fazer algo
mas ainda não sei o quê
quero dizer 
e estou ainda calado

engoli algumas palavras
cuspi algumas lágrimas
e ainda permaneço
em meu próprio martírio

despi de minhas vestes
olhei para o mundo
mundo em um papel em branco
e continuei viajando

não quis chegar a lugar algum
nem sair de mim mesmo
apesar do meu próprio abandono
ainda estou aqui

 
 

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

desconhecimento

depois de um tempo
o nó da garganta se desfez
o livro chegou ao fim
o conto teve um final feliz

deixei a coisa de lado
coloquei ponto final na história
imaginária história

passei a perceber outras ilusões
a perseguir outros sonhos
outras possibilidades

talvez persistir seja um erro
o abandono é uma alternativa
ou então a mudança
o contorno

algumas coisas não precisam ser respondidas
solucionadas
algumas coisas estão no mundo
e só
não precisam de causas
não precisam de consequências

algumas coisas são incompreensíveis
e não precisam ser solucionadas
compreendidas ceêntificamente

o desconhecimento às vezes é a melhor possibilidade
 

sábado, 7 de dezembro de 2013

sim

e se eu lhe perguntar...
se eu lhe colocar em xeque?

diga...
somente que
sim

sim para nossas histórias
sim para nossos sonhos
nosso desejo

sim para sua necessidade de mim
para minha companhia 
para a minha loucura

diga sim para nós
para os laços
para nossos passos

você sabe o que quer
sabe o que deseja
o que espera...

diga sim
sim para as estrelas do céu
para as gotas da chuva
para as tardes de domingo

diga...
não existe certeza em hipóteses
não existe pecado nos romances
nem decisão sem medo
mas diga...

sim para mim
sim para você
sim para o futuro
para o incerto
para o diferente
diga sim

venha comigo para lugares lúdicos
mares e jardins
séries e filmes

seja minha
seja você
diga sim

domingo, 24 de novembro de 2013

voo

quando os portões se fecharem
e os muros se tornarem altos como montanhas
abrirei minhas asas
e num instante
decolarei em delírios
em busca da nova liberdade

quando todos os caminhos
se dissolverem no chão
quando tudo não passar de miragem
me tornarei alado
e como pluma
flutuarei com o vento
sem destino
a um caminho
desconhecido

as asas me deram as nuvens
me deram o céu
me deram o voo

essas asas ainda me farão cair
e cairei
cairei com a certeza de ter feito
feito aquilo que era possível
impossível

não importa onde estou agora
não importa quem sou agora
saberei que minhas asas estão aí
e que a qualquer momento
poderei alçar voo novamente
 

solitários

vejo ela lá longe
sentada com seu cigarro
tão segura
tão inteira
o vento balança seus cabelos
tão solta
tão só

aquela solidão
aquela mansidão
uma solidão tão parecida com a minha

um delírio
quem sabe?
essa solidão me fez apaixonar
me fez desejar

quem sabe a união
a junção das duas
seria surreal
mas...
não seríamos mais sozinhos
e aquilo
aquilo que me cativou
não mais se faria presente

mas acho que haveria outros pontos
outros motivos
motivos para arriscar
perder a solidão não é tão ruim
e podemos valer a pena

que encontremos outra
outra solidão dentro de nós
pois mesmo junto estamos sozinhos
em nós
e você sempre estará sozinha
e eu 
não poderei ser outro
mas que seja bom
que seja para o bem

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

encontro

não finja
não fuja
porquê tudo está anunciado
nas nuvens no céu
nas estrelas no chão...

não tente me esquecer
não recalque
pois quando eu ressurgir
quando eu reaparecer
isso vai doer
vai sentir falta do que não teve
e aí
aí será tarde 
será difícil relembrar o recalcado
o escondido

não minta para mim
não minta para você
sou motivo das suas conversas
suas palavras incompreendidas

um encontro possibilita tudo
um encontro promove o mundo
pense em mim
saiba que sou teu
teu encontro
seja o meu
encontro

guerreiro

ele carrega o mundo
o mundo sobre duas rodas
o mundo todo
todo mundo
moças donzelas
nem tão moças
nem tão donzelas
muito mais moças
transformadas em moças

ele gira a cidade
de cabo a rabo
percorrendo as veias urbanas
corre
mas nem tanto
corre
depressa só que devagar

corre contra o tempo
a favor de um pensamento
hora e lugar marcado
destino e preço

divide as ruas
faz parte da paisagem urbana
colete florescente
capacete
moto veloz

e no asfalto
nas avenidas
divide o espaço
quase sem espaço
correndo pelas beiradas
marginalizado

a sua vida
carrega vida
participa delas
mesmo sem querer
uma estilingada muda tudo
uma saída
um recurso
um socorro

faz tudo com  capacete
e tudo o que se faz com ele
entregador
comprador
encanador
gigolô
ao menos no imaginário
daquele que faz a ligação

como um socorrista
uma chamada
inúmeras possibilidades
infindáveis personas
conflitos e perigos
uma caixinha de surpresas

independente e flúido
o vagabundo trabalhador
pode fazer o que quiser
desde que cumpra as normas
e trabalhe 12 horas por dia
6 dias por semana
com toda a vontade da alma
com toda cordialidade humana
 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

dor

me parece inevitável
esta dor incontrolável
vai e vem sem parar
e quando vejo já está a me flagelar

aqui, não sei explicar
chego a delirar
mas a dor que me altera
se insurge sem espera

a dor permanente
recorrente
me coloca na vida
me deixa sem saída

tudo poderia ser feito
poderia não ter defeito
mas o que me corroe
me surra e não me destroi

ainda que eu tente abandorar
a dor que me faz dispersar
ela ainda vai voltar
para me mostrar
que ainda estou vivo
que não posso ser passivo

então eu luto
luto pra não vencer
e assim continuar a viver
nesta vida de maldito

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

raposa


temi aqueles olhos
aqueles acastanhados olhos
temi por tê-los visto antes
em sonhos e devaneios

tive medo de me inundar
tive medo de não retornar
me fingi de morto para não virar presa
presa daquela avassaladora de pensamentos

tive medo daqueles olhos
daqueles olhos grandes e vibrantes
morri por um instante
morri pois não mais estava em mim
fui capturado

quantos mais não caíram naquela armadilha
e se encantaram pelos olhos da sereia
quantos mais não se perderam
se desencontraram naqueles labirintos

me fiz de morto
mas num relance cai na tentação
na tentação de fitar aquele olhar
então o inevitável
aqueles olhos povoaram meus pensamentos

e agora
agora estou eu aqui
escrevendo os olhos
os arredios e mansos olhos
ainda extasiado
ainda perdido

poderia não ter visto
poderia não ter desejado
mas o cosmo é mais forte
mais forte que o errante
e o poeta
o falante
caiu na armadilha
como raposa desprevenida 

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

mundo

neste mundo não há cegos
não há loucos
não há surdos
não há mudos
não há lúcidos
não há sãos

o que há neste mundo?
neste mundo há pessoas
pessoas humanas
surdas mas não como você pensa
apenas surdas
loucos sim
mas não estes do seu imaginário
loucos apenas

neste mundo há lúcidos
e sãos, como não?
lúcidos como todos os loucos
sãos como todos os desarazoados

neste mundo existem todos
todos os tipos de pessoas
mas não estes tipos que você pesa
apenas tipos

neste mundo correm sonhos
neste mundo voam delírios
devaneios
este mundo somos nós
sem preconceitos
sem conceitos

este mundo é só este
nada mais
apenas mundo

neste mundo somos iguais
mesmo que diferentes
pois iguais são impossíveis
mas não iguais ao que você pensa
iguais no impossível
possível
iguais por habitar o mesmo mundo
mundo desigual

domingo, 10 de novembro de 2013

profana

essa mão no pescoço
o suor na nuca
o batom nos lábios...

sua delicadeza profana
seus cabelos negros e longos
os brincos de argola
e as pernas cruzadas

tudo contaria degraus aos céus
o azul dos seus olhos
e o caminho
o caminhar
já seria o bastante

subir as escadarias do inferno
para num súbito suspirar
gozar do calor dos seus lábios
a fluidez dos meus pensamentos
completamente perversos

qualquer coisa bastaria
para um pobre diabo
o poeta

suas mãos de esperança
possibilitaram a transformação
o desejo
a busca pelo novo...

tudo pode ser perfeito
tudo é passageiro
e os degraus
ao chegarem ao fim
me fizeram pensar
em me jogar novamente
e assim...
vislumbrar as nuvens
como água que cai como chuva

domingo, 3 de novembro de 2013

capricho

ela pinta as unhas
uma de cada cor
coloca seus brincos
de argolas prateados
veste seu vestido preto
rendado
com decote iluminado

quem diria eu 
aqui rendido
por coisas tão inocentes

nos pés 
salto alto
nos cabelos um lenço
lenço vermelho
vermelho cor de sangue

pequenas sutilezas 
me prenderam no ar
me soltaram no espaço

por simples capricho
ela joga os cachos em volta
do espaço sideral
joga com eles
meus pensamentos sãos
e despeja meus desejos pelo mundo

por capricho ela finge que não vê
o refém dos seus atos
preso em seus sapatos
colado em seus brincos
e lenço

o capricho me fez de bobo
me deixo pouco solto
mas ainda louco

foco

não paro de pensar em seu corpo
em seu nu coberto
aquelas pernas levemente bronzeadas
aquele arrepio bom de vento frio

seus olhos de fera domesticada
de encantos
de sedução

seus pés ainda guardam um desejo
desejo de mordiscá-los
de dedilhá-los
massageá-los

seu corpo
sua pele
o calor
o toque

tudo aquilo que pude ver
tudo o que pude imaginar
ainda está aqui

não sei o quanto superar
aquela falta de positividade
algumas coisas não precisam ser
ser pronunciadas

mas se fosse só desejo
se fosse somente loucura
eu mudaria o foco
mas isso não será possível

diga

diga vento
que a chamei de volta
diga a ela que a quis aqui
não sei falar sua língua, vento
mas se o respirar nos mantém tão próximos
este vento que ainda se mantém em meus pulmões
este mudo que assobia...

vento 
faça ela saber
que meus pensamentos ainda estão com ela
nos cachos dela que você acaricia 
nos seus pés que você refresca

vento, lhe invejo
lhe invejo por ser livre
livre e destemido

diga a ela, vento, que lhe fiz provar
que não há nada que não se possa ter
nem que seja imaginário como o vento
que se sente bater no rosto
só podendo ser visto com olhos fechados

digo a ti, vento, meu caro
que quando lhe soltar por aí
que leve a mensagem até ela
para que ela saiba

que assim como você, vento 
que caminha perseguindo os sonhos
eu a busco através de um papel
e meias palavras
como quem busca o horizonte
sem querer chegar ao pôr do sol

domingo, 27 de outubro de 2013

controverso

aquele silêncio ensurdecedor
que estremeceu os ares
confundiu meu pensamento
tão bem desorganizado

aquelas mãos acolhedoras
me expulsaram de mim
queria estar ali
mas fugi por um instante

inflei os pulmões
para ficar sem ar
disse adeus à vida
para poder viver

dei sentido ao meu caminho
desorientado sem destino
decolei com asas fechadas
caí sem estar no alto

escrevi um verso
sem palavras
gritando calado
o aparente não está

flúida

e quando estava olhando
não estava vendo
e quando se fez provar
não deixou tocar
quando ia aparecer
correu pra se esconder
ia falar o que sente
se fechou estritamente
quando ia se expor
provou do dissabor
quando ia se jogar
firmada queria estar
ia trocar as vestes
como se nua estivesse
pensou em voar
mas no chão queria estar
pensou em até morrer
viu seu corpo estremecer
quando ia falecer
viu que antes precisava nascer

espetáculo

estive fora eu sei
e lá foi bom
foi bom?

fiz de você meu espelho
me fiz para você, não eu
um não eu
não eu?

aqui dentro é dor
o que você vê é calor
tudo aqui está pra fora
e o meu encontro
meu encontro
não encontro

aqui dentro não há nada
nada de espetáculo
e o prazer
o prazer
está lá fora
guardado num outro como eu

segunda-feira, 14 de outubro de 2013

cheiro

quero tê-la
quero vê-la
mas não assim
não assim moldurada

assim não há toque
não há corpo
não há nada

quero sentir o cheiro
de pecado
de suor
de desejo
dos cabelos

quero sentir o gosto
dos lábios
da pele
do gozo

quero sentir o corpo
corpo a corpo
suas pernas
seus seios
seus péis
suas flores

quero sentir seus olhos
seus sonhos
suas lágrimas
seus anseios
sua alma

quero vê-la
mas não assim
quero ver por inteiro
corpo e alma
quero vê-la em concretude
quero vê-la em si somente

quero tê-la
mas não assim
saciar o meu desejo de corpo e tu
quero tê-la em meus braços
em meu corpo com o seu

beijar seu rosto
sentir seu corpo
abraçar seu cheiro

domingo, 29 de setembro de 2013

perdido

perdi o conforto
a calmaria de um ventre
para ganhar a vida mundana

perdi o medo de chorar
a posição de quem só espera
para ganhar um pouco de leite

perdi meu poder de rei
quando tinha o mundo aos meus pés
para investir em outros objetos

perdi a leveza da ignorância
a inocência de não conhecer
para me aventurar no mundo do saber

perdi a calma perfeita
a mansidão das águas rasas
para explodir a fúria recalcada

perdi o sonho de felicidade
me amargurando em algumas angustias
para poder me sentir feliz novamente

perdi a rigidez
o apoio da razão inabalável
para me jogar nas incertezas

perdi a identidade
a forma de me ver
para experimentar outros eus

perdi a paciência
o otimismo de um futuro bom
para lutar neste presente

perdi o encanto nela
a cega paixão
para vê-la como uma simples mulher

perdi o compromisso
a obsessão pelo trabalho
para me dedicar ao ócio

perdi a censura
a vergonha de me expressar
para transformar a vida em versos

perdi a vida
uma constância de instantes
para passar para o outro lado

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

coca

uma lata de coca cola
e um cigarro queimado à metade
uma noite repleta de estrelas
e o pensamento...

queria pensar na namorada
mas sequer tinha uma amante

queria pensar na vida
estava tão morto quanto o lúcido

queria pensar em algo
e estava tão vazio quanto um pote cheio

estava a merce do tempo
não havia nada
nenhuma coisa substancial

a fumaça do cigarro
o som do gás...

ele mesmo não estava lá
ou estava com preguiça
preguiça de habitar-se

nicotina
coca
pensar
loucura
negação
propósito
razão
...

jogado

um sonho
um pensar
um devanear
algumas ilusões
outros delírios

uma fada
alguns duendes
bruxas e vassouras

loucuras e seduções
lagos profundos
cachoeiras
mar aberto

dèjá vu

lua incandescente
sol de prata
nuvens de fogo
estrelas correntes

certezas
compromissos
lições
tarefas

braços abertos
laços fechados
corpos lúdicos
pés descalços

coisa alguma
infinito
passado
abstrato
incerto
jogado

domingo, 1 de setembro de 2013

ciência

e se fosse tudo sonho?
e se fosse tudo ilusão?
o que seria de mim?
o que seria de mim?

nos disseram que era errado
nos ensinaram o que não podia
falaram que era feio
nos julgaram insanos

quiseram pregar nossos pés no chão
fizeram com que nos concentrassemos no real
fizeram da ciência a única resposta válida
o sonho não tinha mais espaço

o que move o mundo
não é igual pra ninguém
cada um tem a ciência
de que na razão
muitos sonhos são impossíveis

então não sonhe tanto
não sonhe tonto
porque os sonhos que lhe move
não são tão possíveis assim

quer saber?
qual a graça de sonhar sonhos
se não puder voar?
a graça é ser inalcançavel
é ser louco
pois se chegarmos  a tocá-lo
o gozo
o prazer será inestimável

não me impessa de sonhar
não duvide da meu poder de conquistar
e se tudo for ilusão...
uma miragem é tão real
quanto os motivos que a fizeram nascer
e aquele que a vê
pode senti-la como qualquer outra coisa
é tão verdade
quanto as desculpas inventadas
quanto o dom da razão

nuvens

quando quis ver as nuvens
subiu em seu cavalo branco
pelas colinas verdejantes
correu como vento
chegou onde o céu encontra a terra
e no horizonte levantou os braços

segurando as nuvens na ponta dos dedos
inventou formas que combinassem com sua dor
não havia diferença
céu, terra e ar
nem aquilo que não pudesse imaginar

tocando as nuvens despertou a chuva
a fluidez da água transformou
o que era representação de dor
se fez lágrimas
o pranto escorreu em seu rosto
não havia nada com que se importar
o choro
incontrolável expressão

mesmo sem entender
ele viu suas nuvens se desfazendo
sabia que por algum tempo estariam ausentes
mas que voltariam em seguida
em novas formas
em novas construções

o céu se tornara azul
e o contato com suas nuvens não podia ser mais feito
entendeu que era hora de voltar
em paz consigo mesmo
instantaneamente
cavalgou até a volta
acompanhando o azul do céu

quando chegou já era noite
as estrelas podiam ser vistas
pôde conhecer um pouco mais de si
sabia que as nuvens retornariam
mas o momento era de vislumbre
via o homem carregado de sonhos
o céu carregado de estrelas
e isso lhe trazia uma certeza
o céu se transforma
e ele também

mesmo parecendo estático
céu e terra
a transformação sempre acontece
o céu já é outro
a terra é nova agora
e ele
o homem que vaga
não para com o tempo
é luz e escuridão
é esgotado
e imensidão
possivelmente o impossível

domingo, 25 de agosto de 2013

fuga

estava fugindo daquilo que me causava dor
corri o mais depressa que pude
não vi os caminhos por onde passei
nem por quem passei
não vi que deixei rastros pelo caminho
queria correr da dor
encontrava uma porta aberta
em instantes conseguia ver a luz
conseguia subir junto às nuvens
nenhuma preocupação ou sofrimento
mas ao acordar
ao descer para o próprio corpo
via que nada havia mudado
tudo era dor
me julgaram fraco
se fecharam para meus olhos
e tudo que fazia era errado
não entendia
mas não havia mais razão para estar ali
então a dor voltava a me invadir
busquei novamente o único caminho que sabia
a porta para os céus
era o que existia
mesmo sabendo que iria beijar o chão novamente
mais uma fuga seria mais um erro
mas um erro para quem já é caso perdido
não passa de um grão de areia
passei pela porta diversas vezes
passarei novamente se puder
porque acredito que somente ela
somente através dela
que posso encontrar as nuvens novamente
aquilo que dói aqui dentro
não pode ser entendido
não pode ser retirado
me desculpem os bons
mas ainda sou assim
um homem forte
que expõe o que não deve ficar preso
que mostra a ferida aberta
e que foge
porque a dor que se sente sozinho
a dor não compreendida
não pode ser sentida pelos outros
a não ser que queiram sentir

passado

já fiz poemas
escrevi histórias
ouvi canções

fiz fantasias
elaborei sonhos
construi teses

fiz tantas coisas
que as coisas que fiz
nem eram tantas

costurei vislumbres
curei feridas
fiz novas cicatrizes

vivi com a morte
morri com a vida
nasci e não cresci

pensei ter certeza
de algo incerto
mas não acreditei

passei por muitos
conversei com poucos
carreguei alguns

me apaixonei
me desencantei
continuei vivendo

ainda sou assim
não sei se serei
quem ainda sou

o passado foi futuro
o futuro será presente
e o presente não está

vestes

e quando não havia mais nada
nada a se fazer
ele inventou algo novo

fez o dia raiar em sua mente
se abriu para o improvável
se lançou para o desconhecido

quando não havia mais nada
não havia mais medo
não existia nada a perder

colocou suas vestes de loucura
saiu perambulando pela rua
sem saber

passeou por entre aqueles ditos sãos
flutuou com os visionários
e se fez novo

percebeu que suas roupas refletiam
extravasavam aquilo que carregava dentro
se viu nu em suas vestes

o novo era apenas o antigo
agora trazido à tona
e fez o que fazia todos os dias

teve o dom
teve a coragem
de se ver como realmente é

e o nada?
o nada era tudo
tudo o que carregava dentro de si

não sabia como fugir
não deveria escapar
então enfrentou o medo

se fingiu de corajoso
fechou os olhos
e olhou para si

agora correndo pela vida
se descobre diferente
a cada nova veste

sexta-feira, 16 de agosto de 2013

quis

quis lhe encontrar desde que nasci
quis lhe conhecer desde que te vi
quis lhe dar prazer quando te senti
quis lhe acordar e adormeci
quis escolher e não decidi
quis me amanhecer e seus olhos não vi
quis me arrazoar e enlouqueci
quis me esvaziar e me engoli
quis estar seguro e estremeci
quis estar contigo e me perdi
quis ir longe e fiquei aqui
quis morrer e assim vivi
quis escutar e me ensurdeci
quis correr e não sai
quis fazer algo e escrevi





domingo, 11 de agosto de 2013

noite


uma parte luz
uma parte sombras
uma parte descoberta
outra mistério
a luz urbana ofusca as estrelas
mas ilumina almas mecânicas

quando o sol se vai
e a noite encosta seus lábios sobre a terra
os mundanos
ascendem seus faróis
tentando abraçar a noite
não sabendo que assim
tornam ela mais distante

a noite negra de imensidão
traz com ela o sombrio
a possibilidade de se ver
se ver aquilo que não se vê à luz do dia
aquilo que sem se ver se pode ver
ver sem os olhos
olhos pra quê

hoje a noite traz histórias
memórias
fantasias
loucuras

que a noite caia
e alma brilhe
e mesmo que trancada na casca
no corpo
possa fundir com a noite
se tornando um único mistério
impossívelmente decifravel


domingo, 4 de agosto de 2013

animalidade

racionalidade humana
animalidade insana
corações huanos tão humanos
seres mais elevados dos seres
respeitamos os semelhantes
mas somos incapazes de ver no outro
alguém como nós
diferentes então
deixamos de ser iguais
não há mais necessidade...
de respeito

acabamos com tudo
findamos o mundo
destruímos a nós mesmos
cada um para seu lado
uma humanidade
desumana
nada humana
vendendo o almoço
para destruir a janta
confiando suas vidas
a outras pessoas
para não conviver com a culpa
de ter decidido por si mesmo

nos achando distante dos animais
abominando nossas características
nos dizendo racionais
não passamos de canibais
engolindo o outro
para provar nossa soberania

quem diria os leões
que se dizem reis da selva
controlando o mundo
mais educados que outros
que se dizem reis
escravizando o mundo
se acabando com ele

garçonete

ela está a espreita
aguardando qualquer chamado
qualquer possibilidade de satisfação
está armada para atacar
pronta para abater a presa

se ginga na direção da vítima
paralisa com o olhar
seca seu espírito
e abate sem medo

chega toda delicada
se fazendo de desentendida
se aproxima charmosa....

sorri com todos os pretextos
coloca todos aos seus pés
causando inveja aos astros
esbanja sua própria sensualidade

exalando perfume dos anjos
despertando demônios
finge se entregar...
mas se vai como a brisa de inverno
deixando apenas a conta sobre a mesa 

libertária

jogou as sementes pelo chão
esperou a chuva farta do verão
rezou para que as nuvéns o presenteassem
e dos céus águas precipitassem

brotou como quem nasce na rocha
incerta, mas firme, desabrocha
criou raizes num solo estranho
e daquela montanha fez seu ninho

queria despencar várias vezes
por suas raizes renunciou a muitos prazeres
fugiu da vida para poupá-la
se fechou sem poder vivê-la

quando muitos disseram: não
sua vontade prevaleceu
e onde era só escuridão
com sua luz ela venceu

agora em busca de algo inédito
gastando todo seu crédito
se rompe da rocha firme
podendo cometer seu maior crime

quando a paisagem vista não lhe bastou
uma nova visão buscou
jogando-se num precipício
fez da aventura seu ofício

trocou as vestes de nuvéns brancas
pela água de um ribeirão
às vezes chora pelas lembranças
mas se consola com a nova provisão

hoje navega livremente
sem ter qualquer problema em mente
deixando o curso do rio a levar
para a imensidão do mar

domingo, 28 de julho de 2013

passageiro

adentramos na vida como todas as outras coisas
passageiros de um trem sem trilhos
colocamos nossos passos à venda
obrigados à fazer coisas que não queremos

uma porta se abre e adentramos no vagão
por que entramos, não sabemos
talvez por que muitos entraram
permanecemos lá por um tempo
daí alguém nos joga para fora
novamente somos obrigados a fazer novas escolhas
uma nova porta se abre...

num momento nos acostumamos
aquela coisa indesejável
se torna nosso único ponto de apoio
até que algo acontece e nos põe no chão
estamos novamente andando na multidão

todos vão
todos vem
alguns com pressa
outros nem pensam nas horas
mas passamos por estações que não planejamos
seguimos trajetos que nunca imaginamos
seguimos, apenas

somos passageiros
passageiros de um trem que nos leva
nos leva sem nos perguntar onde queremos ir
pensamos estar no controle às vezes
mas os trilhos são fixos
não podemos vê-los
mas o caminho a percorrer
está cravado no chão
e a ele estamos presos

tentamos por vezes sair
colocar a cabeça para fora da janela
mas ainda continuamos na serpente de aço
num sonho quem sabe
num flutuar longínquo
as coisas saiam do lugar
e nasça a possibilidade
de nos desprender
e a gente consiga vagar
vagar como vagões sem sentido
sem destino
sem trilhos...

sexta-feira, 19 de julho de 2013

pecadores

 
dois pecadores
sentados nos degraus da igreja
sem pretenção de entrar

dois vagabundos
querendo trabalho
mas com preguiça de se levantar

dois corrompidos
tentando ver deus
mas com medo de confessar seus pecados

dois vadios
colocados à margem do sistema
e sem nenhuma vontade de fazer parte dele

dois pilantras
com tanta vontade de se dar bem
sem fazer nada da vida

dois poetas
sentados à devanear
para quem sabe o mundo desvendar

dois patetas
pensando em coisas inteligentes
mas sem inteligência para pensar

dois lúcidos
querendo ser mais realistas
mas com dificuldade de se manterem sãos

dois andantes
sentados à beira do mundo
prontos para decolarem

dois vulcões
prontos para entrar em erupção
mas ainda adormecidos




segunda-feira, 15 de julho de 2013

bobagem

olhe no fundo dos meus olhos
enxergue aquilo que não se vê
todas as palavras que eu já disse
todos os sonhos que sonhei

peço que sinta o que toca seu coração
tudo o que já pensou de mim
tudo o que já sonhou comigo
seus desejos...
seus devaneios...

quando seus olhos me disseram sim
seus lábios entoaram não
quando seus péis caminharam em minha direção
se jogou no chão para não prosseguir

se ainda dividida se corroi de incertezas
não aceita se entregar para o que está
se foge do desconhecido
outra parte acena em minha direção

seu sorriso ainda lhe expõe
seus olhos ainda lhe contradizem
e tudo aquilo que evita
um dia lhe trairá

saiba que o que disse
minhas antigas palavras
não são meras bobagens

são bobagens
chistes
mas são verdadeiras
quero que considere

e estes sinais
seus lapsos de vivência
também não são bobagens
entenda

o que o seu corpo escreve
eu já li
estou apenas esperando
para que você o recite para mim

quarta-feira, 3 de julho de 2013

presente

queria tudo o que o universo poderia me dar
desejei a cada instante uma satisfação
tudo que se mostava vivo
tudo que se mostrava bom

quando acordei pela manhã
queria apenas um raiar de sol
um azul no céu
duas nuvens brancas
café preto, com açúcar
manteiga no pão

não queria muito
mas queria tudo
e o que eu mais quero agora
como meu presente...

queria tê-la aqui comigo
com aquele teu sorriso
discreto
tímido

queria nossos corpos entrelaçados
seus cabelos no meu peito
nossos olhares ao horizonte
pensamentos vagos

queria pouco
queria um presente
estar presente
você presente

aqui um ponto
num instante
que já não é presente
um passado
que já não é
mas o afeto
o desejo
ainda percorrerá o tempo
a vontade ainda persiste

quero pouco
quero toda
apenas uma
...

quarta-feira, 26 de junho de 2013

espelho

vejo aquele homem
pobre homem

poderia ser meu filho
seria um abandono

poderia ser meu pai
seria uma catástrofe

poderia ser meu irmão
seria somente mais um

... meu caro
devo lhe dizer
ele não é seu filho
não é seu pai
tão pouco seu irmão
és tu
és apenas tu
tu encarnado em outrem
a sua distância dele
é a propria distância de ti

como abandona-te?
como se nega?
como tolera sua propria distância?

aquilo que vemos
sabemos
mas o insuportável
deve ser banido de nós
mesmo que para isso
deixemos um pedaço excluso
um pedaço quase todo
uma parte inseparável
toda a parte
mesmo que seja nossa proprria  morte
mesmo que seja nossa propria dor
que ao menos não pareça ser

somos todos falsos
nos olhando nos espelhos
fingindo não ver o reflexo na luz
provando que o mundo não pertence a nós

quinta-feira, 30 de maio de 2013

esperança

mesmo que tudo tenha sido em vão
mesmo que nada tenha feito sentido
as palavras incompreendidas
os desejos insatisfeitos
ainda assim poderiamos tentar novamente
tentar pela simples ação de persistir

quem sabe ainda possamos ser felizes
quem sabe já eramos felizes
mas nossos olhos de tristeza nos fizeram cegos
pode ser que o avanço já tivesse acontecido
ou o mundo encantado já existisse
e nos forçamos a olhar para o outro lado

as crianças ainda brincam de faz de conta
os velhos ainda contam histórias
as noites inspiram os boemios
e a vida...
a vida ainda dá vida a quem vive

então que se faça a vida
que se faça a história
que os sonhos se tornem reais
que surjam novos sonhos,
novos desejos
que a luz dos nossos olhos
aponte para a direção correta

porque hoje
hoje é o dia mais belo de nossas vidas
mesmo que seja duro
mesmo que seja escuro
ainda assim
haverá algo de bom a se sentir
haverá esperança
uma esperança para algo que nunca foi perdido
uma espera que não espera
que realiza
que vive
uma esperança vívida

domingo, 26 de maio de 2013

rosas

trago-lhe rosas vermelhas
bons ventos de superação
as rosas carregam a representação
daquilo que carrego em minh'alma
uma paixão
um desejo
qualquer coisa ligada à passagem das coisas
num instante é belo
explícito
todas sílabas dispostas
todas pétalas misticamente unidas
numa outra possibilidade de universo
numa outra razão de constância
aquilo que uma vez já foi vida
agora dá espaço à transformação
a beleza do rubro petalar do dia
dá lugar à cinzetude do chegar noturno
um cheiro de morte à espreita
uma abertura para a mudança
mesmo a noite mais escura
goza do brilho das estrelas
da inspiradora luz do luar
quando as nuvens permitem seu vislumbre
em seguida impossívelmente
um novo raiar do dia
se faz sem qualquer questionar
daquelas flores que lhe dei
um passageiro triunfo de beleza
pode se tornar um laço verde
quando ao acreditar naquela promessa
você cuidar com toque delicado
com a precisão de um jardineiro sonhador
daquele que somente um galho
galho sem recompensas
para que dele surja
novamente quem sabe...
aquela que do amanhecer
fez a menina  dos meus olhos
uma vermelha rosa explandecente
um sentimento novo reminiscente

ruivos

ela estava linda
sentada de pernas cruzadas
sua mão direita apoiava o queixo
no que estaria pensando?
o que se passa naquela mente?
com olhar perdido num horizonte imaginário
seus olhos transcendiam os óculos
a armação rubra e grossa
não delimitava os olhos de devaneios

com os dedos sobre os lábios
indicador e médio, precisamente
colocou-me a pensar...
um mistério
realmente o acariciar leviano
dos dedos sobre os lábios,
perversos,
me fizeram associar inúmeras possibilidades

seus cabelos ruivos emolduravam um devanear,
seus olhos observavam o mundo ao redor,
pareciam vislumbrar detalhes nunca vistos
mas eu sabia que o mundo não era aquele concreto
aquele objetivo, como flecha que acerta o alvo
não, o mundo era surreal
nunca antes descoberto
um mundo tão distante como nosso proprio nariz

eu a contemplava sem qualquer interesse maior
aquele olhar pouco triste
um olhar de solidão
mas ela estava lá
preenchendo o vazio destas minhas linhas
ao menos eu já não era tão solitário
ela se manteve firme em sua sublime provocação
impensada eu sei
mas se fez presente pelo tempo necessário
tempo possível para uma elaboração
elaboração poética.