domingo, 24 de novembro de 2013

voo

quando os portões se fecharem
e os muros se tornarem altos como montanhas
abrirei minhas asas
e num instante
decolarei em delírios
em busca da nova liberdade

quando todos os caminhos
se dissolverem no chão
quando tudo não passar de miragem
me tornarei alado
e como pluma
flutuarei com o vento
sem destino
a um caminho
desconhecido

as asas me deram as nuvens
me deram o céu
me deram o voo

essas asas ainda me farão cair
e cairei
cairei com a certeza de ter feito
feito aquilo que era possível
impossível

não importa onde estou agora
não importa quem sou agora
saberei que minhas asas estão aí
e que a qualquer momento
poderei alçar voo novamente
 

solitários

vejo ela lá longe
sentada com seu cigarro
tão segura
tão inteira
o vento balança seus cabelos
tão solta
tão só

aquela solidão
aquela mansidão
uma solidão tão parecida com a minha

um delírio
quem sabe?
essa solidão me fez apaixonar
me fez desejar

quem sabe a união
a junção das duas
seria surreal
mas...
não seríamos mais sozinhos
e aquilo
aquilo que me cativou
não mais se faria presente

mas acho que haveria outros pontos
outros motivos
motivos para arriscar
perder a solidão não é tão ruim
e podemos valer a pena

que encontremos outra
outra solidão dentro de nós
pois mesmo junto estamos sozinhos
em nós
e você sempre estará sozinha
e eu 
não poderei ser outro
mas que seja bom
que seja para o bem

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

encontro

não finja
não fuja
porquê tudo está anunciado
nas nuvens no céu
nas estrelas no chão...

não tente me esquecer
não recalque
pois quando eu ressurgir
quando eu reaparecer
isso vai doer
vai sentir falta do que não teve
e aí
aí será tarde 
será difícil relembrar o recalcado
o escondido

não minta para mim
não minta para você
sou motivo das suas conversas
suas palavras incompreendidas

um encontro possibilita tudo
um encontro promove o mundo
pense em mim
saiba que sou teu
teu encontro
seja o meu
encontro

guerreiro

ele carrega o mundo
o mundo sobre duas rodas
o mundo todo
todo mundo
moças donzelas
nem tão moças
nem tão donzelas
muito mais moças
transformadas em moças

ele gira a cidade
de cabo a rabo
percorrendo as veias urbanas
corre
mas nem tanto
corre
depressa só que devagar

corre contra o tempo
a favor de um pensamento
hora e lugar marcado
destino e preço

divide as ruas
faz parte da paisagem urbana
colete florescente
capacete
moto veloz

e no asfalto
nas avenidas
divide o espaço
quase sem espaço
correndo pelas beiradas
marginalizado

a sua vida
carrega vida
participa delas
mesmo sem querer
uma estilingada muda tudo
uma saída
um recurso
um socorro

faz tudo com  capacete
e tudo o que se faz com ele
entregador
comprador
encanador
gigolô
ao menos no imaginário
daquele que faz a ligação

como um socorrista
uma chamada
inúmeras possibilidades
infindáveis personas
conflitos e perigos
uma caixinha de surpresas

independente e flúido
o vagabundo trabalhador
pode fazer o que quiser
desde que cumpra as normas
e trabalhe 12 horas por dia
6 dias por semana
com toda a vontade da alma
com toda cordialidade humana
 

terça-feira, 19 de novembro de 2013

dor

me parece inevitável
esta dor incontrolável
vai e vem sem parar
e quando vejo já está a me flagelar

aqui, não sei explicar
chego a delirar
mas a dor que me altera
se insurge sem espera

a dor permanente
recorrente
me coloca na vida
me deixa sem saída

tudo poderia ser feito
poderia não ter defeito
mas o que me corroe
me surra e não me destroi

ainda que eu tente abandorar
a dor que me faz dispersar
ela ainda vai voltar
para me mostrar
que ainda estou vivo
que não posso ser passivo

então eu luto
luto pra não vencer
e assim continuar a viver
nesta vida de maldito

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

raposa


temi aqueles olhos
aqueles acastanhados olhos
temi por tê-los visto antes
em sonhos e devaneios

tive medo de me inundar
tive medo de não retornar
me fingi de morto para não virar presa
presa daquela avassaladora de pensamentos

tive medo daqueles olhos
daqueles olhos grandes e vibrantes
morri por um instante
morri pois não mais estava em mim
fui capturado

quantos mais não caíram naquela armadilha
e se encantaram pelos olhos da sereia
quantos mais não se perderam
se desencontraram naqueles labirintos

me fiz de morto
mas num relance cai na tentação
na tentação de fitar aquele olhar
então o inevitável
aqueles olhos povoaram meus pensamentos

e agora
agora estou eu aqui
escrevendo os olhos
os arredios e mansos olhos
ainda extasiado
ainda perdido

poderia não ter visto
poderia não ter desejado
mas o cosmo é mais forte
mais forte que o errante
e o poeta
o falante
caiu na armadilha
como raposa desprevenida 

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

mundo

neste mundo não há cegos
não há loucos
não há surdos
não há mudos
não há lúcidos
não há sãos

o que há neste mundo?
neste mundo há pessoas
pessoas humanas
surdas mas não como você pensa
apenas surdas
loucos sim
mas não estes do seu imaginário
loucos apenas

neste mundo há lúcidos
e sãos, como não?
lúcidos como todos os loucos
sãos como todos os desarazoados

neste mundo existem todos
todos os tipos de pessoas
mas não estes tipos que você pesa
apenas tipos

neste mundo correm sonhos
neste mundo voam delírios
devaneios
este mundo somos nós
sem preconceitos
sem conceitos

este mundo é só este
nada mais
apenas mundo

neste mundo somos iguais
mesmo que diferentes
pois iguais são impossíveis
mas não iguais ao que você pensa
iguais no impossível
possível
iguais por habitar o mesmo mundo
mundo desigual

domingo, 10 de novembro de 2013

profana

essa mão no pescoço
o suor na nuca
o batom nos lábios...

sua delicadeza profana
seus cabelos negros e longos
os brincos de argola
e as pernas cruzadas

tudo contaria degraus aos céus
o azul dos seus olhos
e o caminho
o caminhar
já seria o bastante

subir as escadarias do inferno
para num súbito suspirar
gozar do calor dos seus lábios
a fluidez dos meus pensamentos
completamente perversos

qualquer coisa bastaria
para um pobre diabo
o poeta

suas mãos de esperança
possibilitaram a transformação
o desejo
a busca pelo novo...

tudo pode ser perfeito
tudo é passageiro
e os degraus
ao chegarem ao fim
me fizeram pensar
em me jogar novamente
e assim...
vislumbrar as nuvens
como água que cai como chuva

domingo, 3 de novembro de 2013

capricho

ela pinta as unhas
uma de cada cor
coloca seus brincos
de argolas prateados
veste seu vestido preto
rendado
com decote iluminado

quem diria eu 
aqui rendido
por coisas tão inocentes

nos pés 
salto alto
nos cabelos um lenço
lenço vermelho
vermelho cor de sangue

pequenas sutilezas 
me prenderam no ar
me soltaram no espaço

por simples capricho
ela joga os cachos em volta
do espaço sideral
joga com eles
meus pensamentos sãos
e despeja meus desejos pelo mundo

por capricho ela finge que não vê
o refém dos seus atos
preso em seus sapatos
colado em seus brincos
e lenço

o capricho me fez de bobo
me deixo pouco solto
mas ainda louco

foco

não paro de pensar em seu corpo
em seu nu coberto
aquelas pernas levemente bronzeadas
aquele arrepio bom de vento frio

seus olhos de fera domesticada
de encantos
de sedução

seus pés ainda guardam um desejo
desejo de mordiscá-los
de dedilhá-los
massageá-los

seu corpo
sua pele
o calor
o toque

tudo aquilo que pude ver
tudo o que pude imaginar
ainda está aqui

não sei o quanto superar
aquela falta de positividade
algumas coisas não precisam ser
ser pronunciadas

mas se fosse só desejo
se fosse somente loucura
eu mudaria o foco
mas isso não será possível

diga

diga vento
que a chamei de volta
diga a ela que a quis aqui
não sei falar sua língua, vento
mas se o respirar nos mantém tão próximos
este vento que ainda se mantém em meus pulmões
este mudo que assobia...

vento 
faça ela saber
que meus pensamentos ainda estão com ela
nos cachos dela que você acaricia 
nos seus pés que você refresca

vento, lhe invejo
lhe invejo por ser livre
livre e destemido

diga a ela, vento, que lhe fiz provar
que não há nada que não se possa ter
nem que seja imaginário como o vento
que se sente bater no rosto
só podendo ser visto com olhos fechados

digo a ti, vento, meu caro
que quando lhe soltar por aí
que leve a mensagem até ela
para que ela saiba

que assim como você, vento 
que caminha perseguindo os sonhos
eu a busco através de um papel
e meias palavras
como quem busca o horizonte
sem querer chegar ao pôr do sol