domingo, 4 de dezembro de 2016

passageira

vida frágil
vida salta
vida solta

decolam os aviões
a saudade ecoa no peito
órfãos cadenciam as orações
permanece aqui
permanece a saudade
a travessia já se fez
a ausência está mais presente do que nunca

vida breve
vida leve
vida passageira

a vida se vai
fica a dúvida
fica a desculpa ainda não dita
o perdão não dado
o sorriso guardado
o abraço não tem mais o corpo para apertar

vida louca
vida rouca
vida transcendental

a música é tocada nos funerais
choros e velas
orações e interrupções
viúvas, viúvos
órfãos desajeitados
no fim
quem fica quer poder ser egoísta
pra pedir que quem foi
que fique um pouco mais

vida fragmentada
vida abençoada
vida renovada

ficam os pedaços
os pedaços estilhaçados dos que ficam
ficam os pedaços
os traços na lembrança de quem fica
aquele que foi e deixou saudade
o tempo passa
a vida passa
a morte surgirá novamente

vida surge
vida urge
vida vai

a morte chega
os que ficam
os que ficam não são os mesmos
o toque, o encontro, o viver com o outro
a vida ladeada transformou as cadências
a ausência do outro faz com que se mude
emudecidos gritos de saudade
a fumaça sobe
nunca mais seremos os mesmos
estamos marcados eternamente
pela presença da falta do que já se foi

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016

flerte

te vi passar
te vi passar
poderia deixar
poderia fingir não notar
mas seria idiotice
lhe ver
e não flertar com a felicidade

sou alma pequena
tudo ainda é uma construção
talvez tenha fracassado antes do fim
mas se não houve fim
tudo ainda pode se resolver
ou se complicar
viver é complicado

te vi passar
te vi passar...
agarrei tudo o que podia com os olhos
lancei toda luz que tinha
corri o quanto pude
escrevi uns versos
fiz uns olhares
falei algumas besteiras

não podia deixá-la
seria eu uma pipa sem vento
seria chama sem escuridão
veleiro sem mar

de todos os lugares que passei
de todos os abraços em que já tive
seus laços foram os mais cativantes
suas formas mais intrigantes
seu jeito mais inspirador

não há nada neste mundo
que seja absolutamente concreto
nem mesmo somos nós
das almas que já toquei
das loucuras que inventei
certamente
você é o meu risco mais prazeroso
meu desconforto mais gostoso
minha bagunça mais terrível

estou eu aqui
brincando de felicidade
com todas as peças que o mundo me deu
com tudo o que tenho
flertando com a vida
flertando com o riso
flertando com o risco
flertando com a felicidade