terça-feira, 29 de dezembro de 2015

taças


como desço o mundo
como adormeço nesta noite
se seu rosto e seu sorriso
me pedem para ficar desperto

sua voz
sua voz recitando alguns poemas
sejam Drummond ou Pessoa
sua voz entoa minha vida
minha curta vida
meu sonho noturno

nada como a voz
a voz aveludada da morena
o que faço com a noite
se as estrelas se calam
se calam para escutá-la

a alvorada chega
meus olhos cerrados
meus olhos quase fechados
eu ainda inebriado
eu embriagado
eu querendo ela
a voz sem cessar

quero continuar a ouvir
a escutar os versos
mas a vontade de molhar aqueles lábios
aqueles grossos lábios...

uma cicatriz se fecha em meu peito
outra se abre do lado inverso
uma lágrima escorre 
minha lágrima na nuca dela

interrompi os poemas
dádivas de qualquer sonâmbulo
a voz dela cessou
entristeci
mas alegrei
uma nostálgica sensação
uma vontade de repetir
de mesclar os dois prazeres

não teria a voz
se tivesse o beijo
não teria o beijo
se tivesse a voz
persegui gemidos...

como adormecer
se o meu desejo
se o meu anseio
é estar em vigília
é ouvir a voz
navegar os versos
mergulhar nos lábios
naufragar nos cabelos

sucumbi a limitação do corpo
como bons restos diurnos
ainda pude sonhar
sonhar com o objeto desejado
e neste vai e vem
neste ouvir e beijar
me perdi
entre o sono e a vigília
o sonho estava nas duas taças

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